Tive a sorte de fazer escolhas na vida que me levaram a conviver com a diversidade e, por isso também, sou feliz. Não nasci assim. Pelo contrário, bisneta de italianos, cheguei ao mundo no gélido Paraná, onde passei minha infância e início de adolescência, em meio aos cafezais, campos de trigo e muita geada que congelava os dedos e causava dor insuportável. A saída era colocar as mãos próximas ao fogo e esperar que elas ficassem mornas e recuperassem os movimentos. Vivi o frio de bater o queixo e vi o morrer das plantações queimadas pelo frio.
Gélida, também era a relação entre raças que não fosse a nossa. Havia o apartheid explicito entre nós brancos e os negros, geralmente empregados, mão-de-obra sofrida, espoliada, nas terras que estavam sendo desbravadas, nas décadas de 1960/70. Meu mundo foi branco e só fui conhecer o significado da segregação, mas tarde, quando me mudei para a cidade e comecei a ter acesso às informações. Você nasce em uma bolha racista e não sabe que faz parte dela. Até a tomada de consciência, vive-se a normalidade da exclusão, achando-se privilegiada pelas facilidades exclusivas que foram edificadas para você, há séculos, e que custaram milhões de diferentes vidas humanas.
Na universidade, decidi cursar Comunicação para validar meu voucher que abriria a porta do mundo diverso, onde queria estar. A vivência, com excelentes professores e alunos, de diferentes perfis, me situou nesta nova estrada. Formada, decidi que precisaria correr o mundo e experienciar povos, culturas, ir ao encontro do diferente. E a primeira parada foi mergulhar, por um ano e meio, nos estudos do universo indigenista, com estágio prático, por aldeias no sul do Amazonas. A Antropologia me fez enxergar a grandeza e a pluralidade das culturas brasileiras, os muito brasis dentro do Brasil.
E nesse vai sem volta chamado tempo, fui tendo noção das lutas travadas pela sobrevivência dos diversos: negros, indígenas, LGBTQIA+ imigrantes, pessoas com deficiências, mulheres vítimas de violências, ribeirinhos desnutridos. Minha visão da humanidade e da falta dela se expandiu e mostrou que, não importa como nascemos e sim o que decidimos fazer com a vida que recebemos. Isso mostra que a síndrome de Gabriela, a famosa sentença: “eu nasci assim e vou ser sempre assim”, pode ser quebrada, para abrir espaço nos corações e mentes, permitindo o aprender e o fazer necessários, nessa busca por um mundo onde todos vivam dignamente.
E venho aprendendo agora, sobre diversidade, e como ela deve fazer parte da vida empresarial, do contexto corporativo, com meu amigo Tharley, que coordena importante programa, DIEP – Diversidade, Inclusão e Equidade, em uma empresa. No nosso último e gostoso bate-papo, ele falou didaticamente, com brilho solar nos olhos, sobre o trabalho e perspectivas.
Quando lhe perguntei como se constrói a política empresarial, voltada ao tema, ele explicou: “não há uma receita certa, um único roteiro. Mas, é preciso elaborar um processo consciente e genuíno, que faça sentido às estratégias da empresa e, acima de tudo, às pessoas que trabalham nela. Vai muito além de apenas declarar, no código de ética, apoio à diversidade. É preciso ter intencionalidade, consistência e persistência para contaminar o clima e provocar mudanças”.
Segundo Luciano Amato, coordenador editorial e autor do prefácio do livro “Diversidade e Inclusão e suas Dimensões”, Literare Books International, 2022, “diversidade, em seu conceito mais amplo, remete à pluralidade ao considerar os seres humanos, com todas as características, raças, etnias, culturas, gêneros e contextos em que vivem. Os seres humanos são altamente diversos na essência e o normal é sabermos conviver com a realidade dessas diferenças”.
E, para mim, trabalhadora dentro e fora do lar, cabe a reflexão constante sobre qual papel devo exercer nesta construção de sociedade contemporânea. Que colega devo ser no processo de defesa e implantação da DIEP e como somar, efetivamente, a este fantástico movimento inclusivo, que estabelece o direito a todos de seguirem inteiros para os postos de trabalho, sem que tenham que deixar as próprias almas aprisionadas em casa.